quinta-feira, 26 de abril de 2012

As Lágrimas da Lua


 
             Há muito tempo atrás havia somente a noite e o dia. E a noite era tão escura que deixava os homens assustados e refugiados em suas casas, próximos a luz do fogo.  Em todas as tribos,  só uma índia não tinha medo da noite. Ela saía na escuridão e voltava com os cabelos cobertos de vaga-lumes.    Passeava na beira  do  rio  e  dizia  a  todos  que  não  havia  perigo algum.
               Essa índia era diferente de todas as outras. Nascera com a pele mui-to branca e nada lhe causava medo, nem a temível escuridão da noite. Con-tudo, uma outra índia de olhar tão  negro como a própria noite, não  via  os passeios da outra com bons olhos.   Então,  a  inveja cresceu dentro dela de tal forma que a consumia por completo.  Um dia tentou  caminhar  noite  a-dentro,  mas acabou cortando  os pés  nos gravetos  e  seixos da margem do rio. Cheia de ódio e inveja, resolveu falar com a cascavel, um dos mais ardi-losos dos animais.

              – Cascavel, preciso de teu auxílio! – disse.
              – Para o bem  ou para o mal?”, perguntou a serpente.
              – Para o mal! – foi a resposta da invejosa.
              Contente, a cascavel bailou, pois as coisas voltadas para o Mal eram as que lhe traziam mais alegrias. Satisfeita, perguntou.
              – O que quer?
              Um sorriso surgiu nos lábios  da  índia  invejosa,  pois acabara de ter certeza que a cascavel iria ajudá-la.
              – Que mordas o calcanhar da índia branca! – pediu.
              – A que não tem  medo da noite?
              – Esta mesma!
               – Para matar? – perguntou a serpente com um brilho maligno nos olhos.
                – Que fique escura, verde, velha e calada!  – respondeu  a  mulher entre os dentes cerrados.
                 A cascavel mais uma vez  se  rejubilou  de alegria  e  prometeu que faria o que fora pedido naquele mesmo dia. À noite, quando a índia branca foi fazer seu passeio, a cascavel se arrastou,  furtivamente,  por entre a ve-getação e o terreno acidentado, ocultando-se por debaixo de  uma pedra e esperou. Não demorou muito para que surgisse a índia, cantarolando feliz.
               Com astúcia e movimento rápido, a cascavel deu o bote e suas pre-sas morderam-lhe um dos pés.   Todavia,  ao invés  da carne macia, encon-trou algo tão duro que quebrou-lhe as presas, e com eles perdeu seu vene-no.  Surpresa,  a serpente vislumbrou que sua vítima tinha os pés calçados com duas conchas de madrepérolas.
            – Índia infeliz, o que fizeste comigo! – perguntou a banguela cascavel.
            – O que pretendias tu fazer comigo?
            – Ia te fazer escura, verde, velha e calada!
            – Fui salva então, pelo sapato de conchas que o boto me deu! – reve-lou a índia branca.
            – E  por  causa disso,   fiquei sem dentes e sem veneno!   –   concluiu a serpente, chorosa.
            – Mas porque que queria me mal? – indagou a índia branca.
            – Porque és linda e a índia escura não suporta a! – revelou, por fim.
            – Foi ela que te mandou?
            – Sim, pois ela tem inveja de ti!
             Chocada com o que acabara de ouvir, a indiazinha branca começou a chorar.   Jamais imaginara despertar tanto ódio em alguém.    Suas lágrimas eram gotas de luz que se elevaram ao céu,  permanecendo no manto escuro como pontos luminosos.  Agora a noite já não era uma escuridão completa. Chorou por muito tempo até que, quando parou, disse:
             – Não posso mais viver entre os que me odeiam!
              Surpresa, a Cascavel viu a índia branca passar por cima das águas do rio, até o outro lado, e,  assustada,  meteu a serpente ocultou-se em um bu-raco próximo de onde nunca mais saiu.
               Quando chegou ao outro lado, a índia branca procurou a coruja.
              – Mãe coruja, ajuda-me a chegar ao céu! – pediu em tom de súplica.
            Depois de muita insistência, a Coruja consentiu em ajudá-la. Então,  a jovem foi colher cipó  e flor de manacá  suficiente para trançar  uma escada muito linda.   Finda a tarefa,  pediu à coruja que voasse  bem  alto e suspen-desse a escada para que ela pudesse súber.    Então a coruja obedeceu.  Sus- pendendo a escada,  levou  uma  das  pontas  até a porta da morada celeste. Imediatamente, a Índia branca subiu até chegar lá e,  tranqüilamente,  aco-modou-se em uma das nuvens para nunca mais voltar à terra.
            Olhando para o firmamento,   os índios  avistaram aquela forma recli-nada, branca e brilhante,  vagando entre as nuvens,  rodeada de gotas lumi-nosas e, surpresos, disseram:
            – A Lua, a Lua!
            A índia escura e invejosa,  ao ver aquilo,  ficou cega de ódio e desapa-receu, nunca mais sendo vista. Contam que fora morar na cova, juntamente com a cascavel.  No entanto,  a Lua continua até hoje fascinando os homens que sonham um dia trançarem uma corda suficientemente  longa  para,  um dia, irem ao seu encontro.
                                                      FIM 
NOTA DO AUTOR: Esta história é apenas uma versão elaborada pelo autor de uma lenda indígena que conta como surgiu a Lua e as Estrelas.

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